domingo, 22 de abril de 2018

Cinzas de Inverno



Na melancolia de um céu de chumbo
recordo paisagens amargas
momentos escondidos em mapas sem X.
Renascem lágrimas de dor e suores de raiva,
reavivo mantos frios julgados esquecidos
e revejo fotos que não desejava.
Nesse pálido céu de chumbo
numa tarde de Inverno qualquer
que de longe me traz os remorsos
do que, sentindo já não ser, ainda sou,
sinto o peso da culpa
em tempestades de tremura.



Café Central



De costas para ti senti a tua presença;
sei que estás nessa mesa contra a qual, de costas,
sempre me sento.
Senti te o perfume quando cruzaste as pernas
e soube que tinhas chegado, como sempre, silenciosa.
De costas para ti peguei no copo
e ergui-o quase casualmente
na esperança que me reflectisse a tua imagem.
Uma vez mais apenas vi o líquido e bebi um trago.
De costas para ti ouvi-te puxar do maço, tirar um cigarro e acende-lo à 3ª tentativa.
Senti o aroma desse tabaco que não fumo
e o teu olhar cravado em mim.
De costas para ti acabei a bebida,
depositei o custo do consumo sobre a mesa,
levantei-me e saí,
sabendo que estavas a olhar, esperando que me voltasse antes de atravessar a porta do café.
De costas para ti, entranhou-se-me o teu ressentimento pela minha "descoragem".
De costas para mim, senti-me, uma vez mais, incapaz de te suportar o olhar
porque sei que, se o fizesse, entregar-me-ia inevitavelmente a ti.