A rua era estreita e íngreme. As
casas, estreitas e altas, escorriam humidade pelas cicatrizes centenárias.
O chão, de calhau rolado, era
um ringue de patinagem no inverno. O sol dificilmente descia às pedras e o
cheiro a mofo ira como um perfume de marca.
A minha cidade tinha uma parte
muito antiga, corroidamente velha, deliciosamente genuína, onde as casas eram
testemunhas das estórias vividas naquelas ruas estreitas e essas mesmas
testemunhavam muitas cenas caseiras. Eram como as velhas intriguistas, as casas
e as ruas empedradas.
No verão, no quente verão da
minha cidade, era um descanso passar por essas ruas frescas, amenas, calmantes.
A minha cidade, a minha velha
cidade é um misto de encanto e sedução. E é só minha.
Há muito que deixei de a
habitar; visito-a, de fugida porque me dói a transformação que se tem operado.
Não porque esteja pior, mas porque as minhas imagens dela são outras, são mais
bonitas, são vistas pelos olhos de uma criança e pelos de um adolescente e,
finalmente de um jovem adulto.
E essas sim, são as imagens da
minha verdadeira cidade, aquelas que preservo e amo.
Por isso as suas ruas
continuam ingremes e estreitas e as casas suam a sua velha podridão, libertando
um perfume bafiento único. E assim igualei a minha cidade, envelhecendo cada um
ao ritmo do seu tempo.
É bela a minha cidade, conquistando a serra, afagando o rio que a banha.
E é só minha porque mais ninguém a vê como eu sempre a fui vendo.