quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Dezembro recomeça

 

Dezembro instalou-se.

Chegou suavemente, como só o mês de dezembro o sabe fazer. Só os calendários o traem, só as folhas das árvores o sentem e caem como partículas de chuva, submissas à inevitabilidade do tempo final.

As aves migratórias já partiram; eu e as aves migratórias, companheiros de destino, velhos amigos de viagem, comprometidos pelo silêncio, como só os velhos amigos o sabem fazer.

Os velhos amigos, tal como os amantes, não precisam falar para se expressar. Conversam em longos silêncios, com entoações vivas de surdez e afecto. Escutam na ausência e nunca se despedem. Os velhos amigos, tal como os verdadeiros amantes, nunca se despedem, dizem até breve no seu código de olhares. E o compromisso é tal, o entendimento é tanto e o gosto de se sentirem é tamanho, que nem na morte se despedem.

Os velhos, tal como os amantes, são aves migratórias que desistiram do seu destino, mas não dos seus silêncios comunicativos.

Dezembro instalou-se em mim e é terrível na dualidade que me inspira; lindo e triste, o princípio do fim, o prenúncio de algo a renascer. Os velhos querem acreditar que há sempre algo por renascer. Os amantes estão em constante renascimento e a mim, ave migratória que renegou, restam-me as memórias de viagem, os sons dos outros e o silêncio frio das folhas mortas nas calçadas.

 


1 comentário:

  1. Um texto que faz do silêncio uma linguagem e do tempo um lugar habitável. Dezembro não é apenas um mês, mas um estado de alma: onde a perda e a promessa coexistem, onde o fim não nega o renascimento, apenas o adia.
    noname

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