segunda-feira, 31 de julho de 2017

Amor clandestino



Assim que a viu entendeu haver amores proibidos.
Viu-a pela primeira vez quando os seus olhos se tocaram; só os olhos sabem tocar com a fragilidade que a verdade encerra.
É deste modo que as pessoas se vêm a sério, olhos nos olhos, olhos acariciando olhos em conversas sem som nem segundos significados.
Quando os seus olhos se encontraram, tardava o inverno na teimosia do outono, compreendeu duas coisas: o encaixe das formas e a percepção de algo que ultrapassa o desejo.
Seria, sem dúvida, o sentimento que os uniria, um amor saltimbanco numa relação contrabandista.
À margem da lei dos “bons” costumes, encontros furtivos, mãos sedentas de afectos obrigatoriamente contidos mas intensos, em carícias discretas cuja marca perdura na pele.
Aqueles dois tornaram-se o outro lado do amor, o amor fora da lei, o amor bandido, não aprovado, não benzido, não permitido.
Amam-se à distância de uma sociedade, porque nada mais lhes é permitido, mas o seu amor é vadio e não se deixa subjugar.
Amam-se na clandestinidade da razão, na distância de uma mão, mas sentem toda a liberdade de partilha, como só dois amantes o sabem sentir.
E eu, velho niilista empedernido, testemunha de tal compromisso, invejo amargamente a forma discreta, mas tão intensa, como partilham os seus olhares.


1 comentário:

  1. :) Gostei desta parte;
    "Amam-se na clandestinidade da razão, na distância de uma mão, mas sentem toda a liberdade de partilha, como só dois amantes o sabem sentir".

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